Terminou na sexta-feira (18/3), na Praia Grande de Araçatiba, em Ilha Grande, a primeira edição da ‘Justiça Itinerante Marítima’. Ao longo da semana, a ação inédita do programa do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) percorreu outros quatro pontos de Paraty e Angra dos Reis, realizando o total de 396 atendimentos – sendo 113 iniciais e 283 sentenças –, entre casamentos, retificações de registro civil, reconhecimento de paternidade, ação de alimentos, divórcio litigioso, registro tardio de nascimento, por exemplo.
A indígena Lídia Pará Garcia passou seus 18 anos de vida sem certidão de nascimento. A longa espera teve um duplo final feliz na manhã da última quarta-feira (16/3), durante a ação, em Santa Rita do Bracuí, em Angra dos Reis, na Costa Verde do estado. De dentro do ônibus do projeto do TJRJ, o juiz de Direito Eric Scapim Cunha Brandão realizou a audiência com a jovem, dando a sentença para o seu registro de nascimento tardio e também para o registro da sua filha, Ana Sofia Garcia Aquiles, de apenas nove meses. Até então, o bebê só possuía o Registro Administrativo de Nascimento de Indígena (RANI), o que não substitui a certidão de nascimento.
“Ter a certidão é muito importante. Eu demorei um pouco mais para conseguir, mas minha filha, com menos de um ano já vai ter a sua. Agora já posso dar entrada também nas nossas identidades”, comemorou Lídia, membro da aldeia indígena Sapukai Bracuí.
Da esquerda para direita: indígena Lídia Pará Garcia na audiência com o juiz de Direito, Eric Scapim Cunha Brandão Da esquerda para direita: indígena Lídia Pará Garcia na audiência com o juiz de Direito, Eric Scapim Cunha Brandão
O magistrado Eric Scapim é um dos integrantes do grupo formado por juízes, promotores, defensores públicos e servidores que está levando atendimento aos moradores de localidades distantes da costa fluminense que buscam seus direitos. Atuando como voluntário na primeira edição da ‘Justiça Itinerante Marítima’, o juiz revelou que foi a primeira vez que atendeu um caso de processo de registro tardio de uma indígena.
“Estamos aqui para atender todos os cidadãos. Hoje, ela sai com a sentença e já pode dar entrada na certidão de nascimento que tanto esperou”, disse o juiz.
Audiência de divórcio por whatsapp
Além de Santa Rita de Bracuí, o ônibus do projeto esteve na segunda-feira (14/3) e na terça-feira (15/3) no Mercado de Peixe, na Ilha das Cobras, em Paraty; no Parque Mambucaba, em Angra dos Reis, respectivamente. Neste último posto de atendimento, o juiz André Brito realizou uma audiência de divórcio com apoio do aplicativo whatsapp. A mulher, moradora da região da Costa Verde, e o ex-marido, que vive em uma cidade pernambucana, conseguiram concluir o processo, que se seguisse o curso normal poderia demorar seis anos. Quem explica é o desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, coordenador do programa do TJRJ.
“A tecnologia nos permitiu fazer a audiência desta forma e funcionou. Respeitamos todas as cautelas, como por exemplo, a parte de Pernambuco se identificando, fazendo uma selfie com sua identidade ao lado para ser anexado ao processo e informando o desejo de regularizar o estado civil”, contou o magistrado.
Na quinta-feira (17/3), o programa chegou por via marítima à Vila do Abraão.
Roteiro inédito para populações sem acesso à Justiça
Acompanhando todos os dias da ‘Justiça Itinerante Marítima’, o desembargador Joaquim Domingos explicou a escolha pela Costa Verde.
“O programa já está consolidado com os seus postos volantes espalhados pelo Estado, mas, pela primeira vez, estamos aqui. Temos pessoas que nascem, vivem e morrem em suas comunidades e, muitas das vezes, não constam como cidadãos. Percebemos como este problema se ampliou durante a pandemia. Muitos, vistos como invisíveis, não conseguiram os benefícios oferecidos pelo governo durante o período da pandemia, por exemplo. Estamos atentos a esta realidade e nosso objetivo é atender cada vez mais à população”, reforçou o magistrado.
Desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, coordenador do programa ‘Justiça Itinerante’ Desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, coordenador do programa ‘Justiça Itinerante’
A regularização do registro civil está sendo um dos principais atendimentos nos postos de Paraty e Angra dos Reis. É a hora de quem não tem certidão de nascimento ou não foi registrado buscar seu direito. Nos postos também é possível ter ajuda para localizar certidão de nascimento; rever algum erro na certidão de nascimento ou casamento; colocar o nome na certidão de nascimento do filho; ou registrar filho fora do prazo estabelecido.
Casamento e divórcio
O cidadão que deseja pedir a guarda de criança ou adolescente; que quer pedir interdição de pessoa portadora de doença mental ou anomalia psíquica; assim como o que comprou uma mercadoria com defeito ou contratou um serviço que não foi atendido também está sendo acolhido nos postos. Nos espaços volantes é possível ainda transformar uma união estável em casamento ou mesmo oficializar uma separação através de divórcio.
Um dos casais atendidos na quarta-feira foi Andreza Souto e Ednaldo Cândido, de 37 e 38 anos, respectivamente. Após 20 anos de relacionamento, a dupla conseguiu oficializar a tão sonhada união.
“No começo do relacionamento, quando era muito jovem, queria me casar, mas o tempo foi passando e desisti da ideia. Há pouco soube, através da escola da minha filha, que teria atendimento da Justiça Itinerante e resolvi resgatar este sonho que estava adormecido”, contou Andreza, que agora planeja casar na igreja.
Teve quem desejou casar e também quem buscou solucionar o imbróglio do divórcio. Foi o caso de Elizângela Cerqueira, de 47 anos, que, mesmo com o calor forte, não desanimou e aguardou ansiosa o desfecho do seu processo.
“Hoje é dia de recomeço, volto a ter a minha liberdade. Valeu muito a pena esperar”, comemorou a mulher. Elizângela, além de garantir o seu divórcio, participou como testemunha do casamento da irmã, Viviene de Souza Andrade, de 40 anos.
Outras três ações da ‘Justiça Itinerante Marítima’ já estão programadas para este ano. Os eventos serão realizados nos meses de junho (6 a 10), setembro (19 a 23) e novembro/dezembro (28/11 a 2/12).
IA/FS
Fotos: Brunno Dantas/TJRJ
Fonte: TJRJ