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“No Cartório, O Atendimento é Humanizado E Aproxima O Cidadão Do Real Sentido Da Proteção Da Capa Jurisdicional Do Estado”

Claudio Bordallo, presidente da Comissão Notarial e Registral da ABA – RJ, e Cristina Cruz, diretora da Associação, concederam entrevista exclusiva ao CNB/RJ

Suspensão de pena de prisão do devedor de pensão alimentícia, conflitos com relação à guarda e convivência de pais e filhos diante do distanciamento social, e a realização de procedimentos à distância. Estes são alguns dos efeitos trazidos pela pandemia da Covid-19 citados por Claudio Bordallo, presidente da Comissão de Direito Notarial e Registral da Associação Brasileira de Advogados – Regional RJ (ABA-RJ), e por Cristina Cruz, diretora da ABA-RJ,

Em entrevista exclusiva ao Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio de Janeiro (CNB/RJ), os integrantes da ABA-RJ comentaram sobre a área do Direito brasileiro dedicada a regular os aspectos do convívio familiar e os impactos causados pelo cenário pandêmico no Brasil nas execuções provenientes de decisões de Varas de Família, planejamento sucessório em caso de morte de familiar, desjudicialização plena e ainda sobre o aumento do número de divórcios, incluindo os atos e procedimentos realizados de forma online pela plataforma do e-Notariado.

Para Claudio Bordallo, “a Covid-19 acelerou alguns processos que inevitavelmente iriam acontecer num futuro próximo, só que de uma forma orgânica, mais natural”. Segundo ele, um bem em meio ao caos gerado pela pandemia, e que foi inserido diante de realidades em franca expansão do meio digital e da inteligência artificial. Contudo, ele e Cristina Cuz são unânimes em destacar que aumentaram os conflitos em relação a guarda e convivência de pais e filhos diante do distanciamento social, assim como a suspensão de pena de prisão do devedor de pensão alimentícia que, deve acabar com o fim da situação de calamidade pública.

Também neste último ano, a área notarial testemunhou o crescimento, de forma exponencial, dos pedidos de divórcios extrajudiciais. “Acredito que o confinamento tenha ampliado o desgaste emocional e financeiro dos casais, e muitas relações familiares que estavam sendo suportadas, sofreram rupturas”, afirma Cristina.

Na visão do presidente da ABA-RJ, os problemas vão além do confinamento, pois a mudança da sociedade reflete diretamente na rotina corrida e na ausência de relações entre as famílias em seus lares. Para ele, a pandemia gerou um reencontro forçado e trouxe à tona causas efetivas perdidas e sufocadas com a correria do dia a dia.

“A sociedade deve refletir sobre a vida que se está levando e analisar quais são os seus reais valores e quais os aspectos morais de uma união conjugal. Ao meu ver, as exigências para ingressar no mercado de trabalho aumentaram muito dos anos 70/80 para os dias de hoje, fazendo com que os filhos se dedicassem cada vez mais tempo aos estudos. Já a mulher ingressou com força total no mercado de trabalho, diminuindo ainda mais o tempo de convivência das famílias em seus lares. Mas isso mudou da noite para o dia com a pandemia”, diz. “O confinamento potencializou atritos até então inexistentes, mas que fizeram emergir antigas situações mal resolvidas pelo casal, diretamente ligadas ao estilo de vida, aos valores individuais e aos aspectos morais. Houve um aumento, inclusive, de casos de violência doméstica”, conclui Claudio.

Aumento dos atos

Considerado um dos maiores avanços dos últimos tempos no meio notarial, a plataforma e-Notariado permite que inúmeros atos notariais sejam praticados de forma online, unindo as partes interessadas por meio de videoconferência e oficializando as escrituras com segurança jurídica, tal qual fossem realizadas de forma presencial em cartório. A inovação é aplaudida pela diretora da ABA-RJ, defensora da desjudicialização.

“Acredito que a medida certamente facilitou que casais separados de fato, que viviam em cidades ou países diferentes, pudessem regularizar sua situação jurídica. Outros, aproveitaram a oportunidade e facilidade para se divorciar sem precisar ter contato com o ex-parceiro”. Já o presidente da Associação sinaliza que o aumento no número de divórcios pode não ter ligação com o lançamento da plataforma em si, já que houve a manutenção das regras para a prática do divórcio extrajudicial. Para ele, a ferramenta apenas facilitou a prática.

O advento da pandemia da Covid-19 fez muitas vítimas e o País chegou à marca de mais de 400 mil mortos pela doença. Com base na crise de saúde pública instalada, identificou-se, também, o aumento nos números de testamentos, partilhas, doação de bens e inventários, e, ao que tudo indica, o brasileiro precisou encarar o inesperado, mas não menos importante, a prática de atos de sucessão dos bens.

Acentuado pelo lançamento do e-Notariado em junho de 2020, que permite a prática do ato por videoconferência, o Estado do Rio de Janeiro registrou alta de mais de 80% no número de transferência de bens apenas entre o primeiro e o segundo semestre do ano passado

Cristina Cruz destaca que o planejamento sucessório ganhou um novo status na sociedade neste momento de calamidade pública, mas que também se deve à capacitação técnica e mudança de paradigmas dos próprios operadores do Direito, que enxergaram na justiça multiportas a ampliação do seu cardápio de serviços. “A oferta de planejamento, seja sucessório ou matrimonial, tem como foco a prevenção ou redução dos conflitos familiares. Existe uma possibilidade real dos casos de morte estarem fazendo o brasileiro começar a mudar o pensamento quanto à sua importância”.

O presidente Claudio Bordallo comenta que, apesar de ser um ponto delicado, fica mais confuso e angustiante pensar nos problemas que ficarão após a morte e que podem ser motivos de discórdia entre os herdeiros. “Empresas como Casa José Silva, grupo Pão de Açúçar, Arapuã Eletrodomésticos, são alguns exemplos de instituições que tiveram sérios problemas com disputas entre herdeiros, algumas delas fazendo com que as empresas fechassem as portas. A disputa pela herança do ator Marcos Paulo, e, mais atualmente, a do apresentador Gugu Liberato, são outros exemplos das confusões causadas pela falta de um planejamento sucessório”.

Ele ainda lembra que, além do planejamento precisar da orientação de um profissional, existe uma crença de que deve ser feito apenas para aquelas famílias que possuem muito patrimônio, e, por isso, precisam necessariamente de uma blindagem patrimonial, o que não é verdade. “A herança de uma casa simples pode gerar tanto ou mais conflitos do que uma herança com diversos bens. Um planejamento sucessório pode evitar isso”, afirma Claudio.

Sobre a percepção dos brasileiros acerca do tema, Bordallo destaca que em países da Europa e nos Estados Unidos a prática já é bem difundida. “Acredito que a crise da saúde pública possa, além de outras coisas, ter feito o brasileiro pensar mais na possibilidade de sua morte e nas suas consequências. E, com isso, há a tendência do aumento da quantidade de atos notariais vinculados a estes planejamentos sucessórios”.

Divórcio extrajudicial

Outro tema em discussão no meio do Direito de Família é a ampliação dos atos de divórcio em cartório, mesmo nos casos com menores envolvidos. Nesse sentido, Cristina Cruz defende a desjudicialização como um todo, de todos os procedimentos consensuais. “Já estamos em uma nova fase do Direito e os cartórios extrajudiciais estão aptos a assumir essa demanda”, afirma a diretora da ABA-RJ.

Seguindo o mesmo raciocínio, Claudio Bordallo defende que as autoridades sejam mais sensíveis aos clamores sociais no que diz respeito à desburocratização do divórcio envolvendo menores. “Ao meu ver, o Ministério Público poderia criar um departamento extrajudicial em sua organização, podendo ser realizado o divórcio seguindo os modelos de entidades como CEHAB e afins, cujos diretores e procuradores só assinam as escrituras depois de aprovadas as minutas pelas entidades, comparando essas minutas com os atos impressos nas folhas dos livros de Notas. Mas acredito que estamos no caminho e que em pouco tempo atingiremos esse meio termo, já que será bom para as partes, para os advogados, para os promotores, para os juízes, para o Judiciário e para a sociedade em geral”, afirma.

A prática de serviços consensuais pelos Cartórios de Notas gera segurança e agilidade, e desafoga o Poder Judiciário de causas menos complexas. Sobre a temática, o presidente da ABA-RJ comenta que este é o caminho natural das demandas que são mais administrativas, do que propriamente judiciais. “A Lei nº 11.441/2007 foi um divisor de águas nessa situação e posso dizer que sou um entusiasta dessa ampliação, pois aproxima mais o cidadão da busca pelo seu direito, já que ele lida diretamente com o tabelião, contando diretamente as suas angústias, os seus desejos, suas intenções, suas possibilidades e limitações, ao passo que, pela própria estrutura do Judiciário, isso é praticamente impossível de acontecer em relação ao juiz de uma causa”, explica Claudio.

Diretivas Antecipadas de Vontade

Dentre os aspectos estudados pela área do Direito de Família estão as DAV, Diretivas Antecipadas de Vontade, instrumento em que a pessoa registra como deseja ser tratada em caso de moléstia grave. Um filme disponível na Netflix chamado “Eu me Importo” trata dos serviços de curatela nos Estados Unidos, e em meio a este cenário, estão as DAVs, que mexem com o conceito de autonomia de vontade do indivíduo e, consequentemente, impactam a família como um todo.

Analisando o tema, o presidente da ABA-RJ cita a DAV como um grande avanço social dos últimos tempos, inclusive, por poder ser realizada dentro de um planejamento sucessório. “Ninguém está imune, por exemplo, a sofrer de uma hora pra outra um acidente, ou ter uma moléstia e perder a sua consciência total ou parcialmente, temporária ou permanentemente. Daí a importância dessa diretiva de vontade, diferente do testamento vital, por não passar de uma escritura declaratória onde o outorgante indica como e por quem gostaria de ser cuidado em caso de perda de consciência ou de grande dificuldade motora”, esclarece.

Relação com a advocacia

Segundo Claudio Bordallo, em tempos de Covid-19, onde a moléstia pode não apenas levar ao óbito, mas também desencadear sequelas ao organismo por doenças pré-existentes ou comorbidades, as DAVs tornaram-se um instrumento que deveria ser levado mais em consideração por parte da população. “A atividade extrajudicial é uma importante área de prestação de serviços que impacta toda uma sociedade. Em conjunto, a advocacia extrajudicial desempenha papel fundamental de contribuição aos usuários por ser imprescindível seu envolvimento entre as partes”.

Para o presidente da ABA-RJ, a atividade extrajudicial é parte da vida do cidadão. “Nascemos com um registro no cartório, morremos com outro registro. No meio desse caminho, usamos o cartório para casar, comprar casa, comprar carro, abrir empresas, celebrar contratos, reconhecer assinaturas, autenticar documentos, registrar o nascimento dos filhos, enfim, a atividade extrajudicial está presente nas nossas vidas com um imenso grau de importância”.

Em relação a prestação de serviços notariais no Estado do Rio de Janeiro, Cristina Cruz relaciona a eficiência do serviço ao profissional que atende às demandas, e defende a capacitação técnica para os escreventes, com uma melhor oferta de serviços ao cidadão.

Já o presidente Claudio Bordallo destaca uma discrepância que possa existir entre cartórios notariais, principalmente em serventias do mesmo município. “Sendo um serviço público delegado, penso que talvez fosse necessária uma revisão da situação, já que o serviço notarial é uma atividade técnica auxiliar da Justiça. Defendo que, como em qualquer outra atividade, é preciso rever alguns aspectos. Contudo, acho que, de uma maneira geral, a prestação dos serviços notariais do Rio de Janeiro está num estágio muito bom e em franco crescimento”, finaliza o presidente da ABA – RJ.  

Fonte: Assessoria de Comunicação – CNB/RJ

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