Além do que prevê o Provimento 69/2021, outras iniciativas podem ser utilizadas para coibir e proteger a integridade do idoso durante a prática de atos nos tabelionatos de Notas
A pandemia do Covid-19 trouxe um aumento considerável no número de registros de estelionato, entre outros crimes financeiros praticados contra idosos. O período foi de muita vulnerabilidade para inúmeras famílias, seja por motivos de terem perdido sua fonte de renda ou por conta do período de quarentena, que gerou o isolamento social de grande parte da sociedade. Tanto um quanto o outro geraram queda na economia brasileira, e a esperança de dias melhores, com perspectiva de abertura de vagas no mercado de trabalho, deu lugar à incerteza e à dificuldade de enfrentar um dos piores momentos da história.
Para falar sobre o impacto da pandemia e sobre a instituição do Provimento 69/2021, da Corregedoria-Geral da Justiça do Rio de Janeiro, que obriga que atos notariais realizados por pessoas com mais de 80 anos em cartórios de notas seja filmados por terceiros, na intenção de garantir a integridade do idoso, o Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio de Janeiro conversou com Fátima Henriette de Miranda e Silva, presidente da Comissão Especial de Atenção ao Idoso da OAB/RJ – Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro.
Confira a entrevista na íntegra:
CNB/RJ – Quais os objetivos e de que forma funciona a Comissão Especial de Atenção à Pessoa Idosa?
Fátima Henriette de Miranda e Silva – A Comissão Especial de Atendimento à Pessoa Idosa possui como objetivo auxiliar a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional do Rio de Janeiro, a trabalhar pautas que se relacionam com o Direito da Pessoa Idosa.
Assim, considerando o papel social da OAB de zelar pelos direitos e garantias dos cidadãos, participando de forma ativa na construção de uma sociedade mais igualitária e livre, a CEAPI, junto ao Dr. Luciano Bandeira e toda a diretoria da OAB/RJ, trabalha em prol da proteção e da garantia dos direitos das pessoas idosas.
CNB/RJ – Durante o período mais crítico da pandemia, no ano de 2020, houve um aumento expressivo no número de registros de violência patrimoniais contra os idosos. Na sua opinião, qual ou quais seriam os motivos para este aumento?
Fátima Henriette de Miranda e Silva – A pandemia ocasionou uma crise financeira para várias famílias. Muitas pessoas que moravam de aluguel, em decorrência dessa crise financeira, foram obrigadas a entregar os imóveis e buscaram refúgio na casa dos pais ou dos avós. Não que justifique, mas acredito que as consequências econômicas da pandemia contribuíram de forma direta com o aumento da violência patrimonial praticada contra pessoas idosas.
CNB/RJ – A comissão recebeu denúncias ou qualquer outro tipo de manifestação sobre essas ocorrências durante o período? De que forma ela ampara e garante a proteção aos direitos dos idosos?
Fátima Henriette de Miranda e Silva – Sim. Advogados e não advogados geralmente procuram a comissão para saber como devem proceder para coibir a ocorrência de todo o tipo de violência praticada contra pessoas idosas.
É importante pontuar que denúncias sobre casos de violência devem ser realizadas nas delegacias, no Ministério Público, na Defensoria Pública ou até mesmo no disque 100 e que embora a Comissão Especial de Atendimento à Pessoa Idosa não tenha competência para investigar tais denúncias, fazemos o acolhimento e direcionamos essas pessoas aos órgãos competentes para que possam ser bem assistidas.
CNB/RJ – As serventias extrajudiciais junto à Corregedoria de Justiça do RJ têm se movimentado para atuar de forma mais assertiva durante a prática de atos por pessoas idosas. A comissão busca se aproximar desta esfera a fim de sugerir e se posicionar com relação aos atendimentos prestados pelos cartórios?
Fátima Henriette de Miranda e Silva – Buscamos sempre manter um diálogo aberto com toda a sociedade civil e embora não tenhamos ações em conjunto com as serventias extrajudiciais, estamos a disposição para, em conjunto, pensarmos em como podemos promover ações de conscientização, cursos, palestras e qualquer outra atividade que seja capaz de garantir a efetividade dos direitos das pessoas idosas.
CNB/RJ – Como avalia a prestação dos serviços e a instituição do Provimento 69/2021 que altera a redação do Código de Normas da CGJ/RJ, instituindo que atos praticados por pessoas com mais de 80 anos seja filmado por um terceiro?
Fátima Henriette de Miranda e Silva – O referido dispositivo institui a gravação, mas não esclarece, dentre outras coisas, quem deverá gravar e por quanto tempo tal gravação deverá ser armazenada. O Rio de Janeiro é o terceiro Estado com maior número de pessoas idosas e garantir a proteção e os direitos desses idosos é um grande desafio!
Acho louvável que a Corregedoria Geral da Justiça do Rio de Janeiro esteja buscando meios de garantir maior proteção as pessoas idosas, mas o desafio é muito maior do que a gente imagina! Cada vez mais nos deparamos com notícias de golpes praticados contra pessoas idosas, estelionatários, aproveitadores e até pessoas da própria família buscam se aproveitar da maior vulnerabilidade do idoso para alcançar algum tipo de proveito econômico.
Determinar que atos notariais sejam filmados talvez seja um primeiro passo, mas precisamos continuar avançando na pauta que fala sobre a proteção das pessoas idosas, precisamos envolver a sociedade civil e conscientizar idosos e não idosos sobre a importância de se garantir a efetividade dos direitos da população longeva.
CNB/RJ – Que outras iniciativas acredita que inibiria situações de fragilidade financeira sofridas pelos idosos?
Fátima Henriette de Miranda e Silva – Acredito que alcançaremos um percentual maior de êxito quando deixarmos de atuar no problema para atuar na causa. Muitos idosos sequer conhecem quais são os seus direitos e como reivindicá-los! A pessoa idosa lúcida, capaz, precisa saber que existe um abuso quando um familiar se apropria do seu cartão do banco ou passa gerir sua vida financeira restringindo o acesso do idoso ao seu próprio dinheiro. No caso de idosos que demandam cuidados, precisamos garantir que o Ministério Público tenha efetivo suficiente para acompanhar a atuação dos curadores desses idosos e o mais importante de tudo: precisamos conscientizar os não idosos sobre a ilicitude do se apropriar dos bens e finanças dos idosos e das consequências cíveis e penais de tais atos.
Fonte: Assessoria de Comunicação/ Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio de Janeiro.